Existe um método mais eficiente para ensinar a ler e escrever? Alguns acreditam que sim. Outros preferem apresentar o mundo das letras às crianças e construir juntos o que funciona para cada um.
Debates sobre a melhor maneira de alfabetizar as crianças não são uma novidade dos nossos dias. "Por mais de um século, os esforços de mudança das escolas se concentraram nessa questão", diz Maria do Rosário Longo Mortatti, professora livre-docente da área de educação da Universidade Estadual Paulista. Até o final do século 19, as escolas costumavam alfabetizar usando os chamados "métodos sintéticos", que vão da "parte" para o "todo". O método alfabético utiliza as letras. O fônico, os sons correspondentes às letras. O silábico, as sílabas. Em um segundo momento, percebeu-se que seria melhor utilizar métodos analíticos, que partem do todo. Passou-se então a ensinar leitura e escrita a partir de palavras, sentenças ou historietas, que faziam mais sentido para as crianças, para só depois chegar à análise das partes: as letras. "Muitas escolas mesclaram os dois métodos, dando origem ao analítico-sintético ou vice-versa", diz Maria do Rosário. A partir de 1980, porém, o uso desses métodos passou a ser fortemente questionado. "Nesse momento chega ao Brasil o pensamento construtivista sobre a alfabetização, resultante das pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita, desenvolvidas pela argentina Emília Ferreiro", explica Maria do Rosário. As pesquisas de Emília mudaram o foco de "como se ensina" para "como se aprende". Parece pouco, mas essa mudança causou uma revolução.
"Suas pesquisas mostraram que as crianças criam hipóteses próprias sobre a escrita, muito antes de serem autorizadas pela escola a aprender. E que o ensino precisa dialogar com essas hipóteses", diz Telma Weisz, coordenadora do curso de especialização em alfabetização, do Instituto Superior de Educação Vera Cruz. Para o pensamento construtivista, deixar crianças pequenas escreverem o que quiserem num papel ou lousa faz parte da alfabetização. Elas não produzem rabiscos, ainda que pareça. O que estão fazendo é se aproximar da cultura escrita. "Não é necessário levar o ba-be-bi-bo-bu para a sala, nem falar da fonética. A criança percebe tudo sozinha. Isso é o que Emília mostrou. Para aprender a ler, o que você precisa é pensar sobre a escrita. Esse é o ponto difícil para algumas pessoas entenderem", afirma Telma.
O pensamento construtivista foi, gradativamente, sendo disseminado entre os educadores nas escolas brasileiras. Mas a falta de um "método construtivista" deixou os professores perdidos. Eles entendiam a teoria, mas se perguntavam como fazer em sala de aula para trabalhar com essas hipóteses dos alunos. "Com isso, às vezes sem admiti-lo, escolas e professores uniram, de formas próprias e muito diferentes, o que entendiam da perspectiva construtivista com os métodos antes utilizados", diz Maria do Rosário, que entende que não é possível prescindir de métodos, de um caminho, um procedimento.
Construtivismo: discurso e prática
Hoje, muitas instituições particulares dizem acreditar no pensamento construtivista. "Praticamente não há escolas que não se assumam construtivistas", observa Fernando José de Almeida, ex-secretário municipal da Educação de São Paulo. "Só que isso não é real para grande parte delas, porque, em muitos casos, o construtivismo se tornou um discurso, mas não se constituiu em uma pratica", diz. Os colégios integrados Domus Sapientiae e Montessori Santa Terezinha, por exemplo, inicialmente usavam apenas o método fônico. "É uma técnica de decodificação de sons criada no início de 1900. Com as pesquisas de Emília Ferreiro, sabemos que a criança está em contato com o mundo letrado desde cedo e que precisamos trabalhar com isso, antes inclusive de apresentar os sons. Valorizamos mais do que antes a importância dos textos, o tempo que cada aluno precisa para ler e escrever", diz a coordenadora Solange Rodella. No colégio, desde pequenas as crianças são estimuladas a ampliar o seu universo de leitura, por meio de histórias, e a pensar sobre a cultura escrita. "Aos 6 anos, apresentamos grafemas e fonemas às crianças", conta. Depois das vogais, elas aprendem, por meio dos sons, o "PVR" e daí por diante. Entram, então, os ditados: a partir de um desenho, o aluno forma a palavra com letrinhas de madeira. Após a construção das palavras, há o momento de auto-correção, pois a criança tem a seu lado o modelo correto. "Entendemos que de nada adianta ter idéias e não saber expressá-las ortograficamente, assim como não há validade em escrever corretamente, mas sem idéias", afirma Solange. "Torna-se impossível separar os dois".
Fonte: educarparacrescer.abril
Texto Carolina Tarrio
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